quinta-feira, 6 de março de 2014

Japão: e seu Estilo de Fazer Teatro

        O Teatro Nô surge no Japão – 
"A Desindividualização do Ator"

“A flor é a vida do Nô” (蓮の花)

    A origem e evolução do Teatro Nô é a de uma inter-relação constante, entre suas origens sagrada e profana. O zen budismo, com a sua filosofia de vida espartana apresenta íntima relação, no Japão feudal, com os shoguns militares e a vida dos samurais.
   O período Muromachi, tendo os templos zens como importantes centros de cultura, dá a expressão a uma notável cultura nacional como no caso da cerimônia do chá, do ikebana e dos teatros Nô e kyôgen. Artes nascidas da união da cultura aristocrática civil e da cultura militar.
   O Teatro Nô nasceu das apresentações cômicas populares: "dengaku e sarugaku". O dengaku constituía-se de canções e danças apresentadas pelos agricultores e sacerdotes durante os festivais agrícolas dos arrozais augurando uma boa colheita. Por sua vez, o sarugaku era uma espécie de farsa (cenas trivial ou burlesca, gracejos, situações cômicas, ridículas etc.) da cidade, incluindo exibições com animais, saltimbancos e truques de mágica.

(exemplo Dengaku)

(Dengaku)

(Sarugaku)

   Certo momento da sua evolução o Teatro Nô teve total apoio artístico e financeiro do shogun Yoshimitsu. Houve a transição do sarugaku nô, teatro burlesco e popular, para o "nogaku", teatro culto e elegante. O empreendimento de uma verdadeira revolução qualitativa nesse até então de simples divertimento. O gradual refinamento artístico do Nô, tinha a finalidade de agradar ao público das classes superiores.
   O nogaku é constituído dos teatros nô e kyogen. O kyogen, entretanto é cômico, reflexos dos sentimentos e modo de vida do povo.

(Nôgaku)

(Nôgaku)

(algumas máscaras Kyogen)

(Kyogen)

(Kyogen: a comédia japonesa)

   Durante o período Edo (1603 – 1866), o Teatro Nô se torna uma arte cerimonial e filosofia oficial do shogunato Tokugawa


  Com o estabelecimento de um critério inquestionável, a codificação do Teatro Nô, e consequentemente, a possibilidade de perpetuar a arte, polindo as suas técnicas até a perfeição, o Teatro Nô consolida-se em uma forma fixa, não mais modificando até os dias de hoje.

   “A flor é a vida do Nô”: 

"aplicação da noção de flor, hana (蓮の花), a todos os aspectos do Teatro Nô. A flor é a surpresa e a novidade. No Teatro Nô, a flor é o insólito, o magnetismo despertado pela atuação no palco; um jogo teatral produzido pelo ator, através da combinação de beleza e mistério, visando a produção de uma emoção inesperada no espectador. A técnica que se dá através do estudo dos dois elementos: o canto e a dança, e dos personagens tipos de mímicas."

(cartaz de uma peça Nô)

   A formação do ator Nô se processa de acordo com a sua evolução etária; da infância à maturidade, o estudo conveniente a cada idade. O ator considera sua profissão um ato sagrado, uma disciplina moral. As essências das coisas a serem imitadas no Teatro Nô são denominadas yûgen e tsuyoki. O yûgen possui um significado além das aparências como a sensação do místico, o refinamento físico e espiritual, com ressonância no zen.
   A compreensão do tsuyoki é o princípio da força de atuação vigorosa até mesmo como uma árvore sem flor, mas que encerra grande força interior.
E a veia principal da atuação é a confiança em si, pois nada, nos dá mais força do que estarmos seguros de nós mesmos.
   Na mímica do Teatro Nô verifica-se a eliminação de todo elemento acessório, a redução ao essencial; não há expressões fisionômicas, apenas um código gestual altamente estilizado e mesmo nas peças sem uso de máscaras, o uso da própria face como máscara, isto é, a adoção do rosto imóvel, inexpressivo. O ator de Nô tem sempre em mente o princípio básico de que, quanto maior a contenção corporal, maior a liberdade do espírito. A princípio, as técnicas do Nô na visão de Zeami deveriam ser secretas somente passadas para pessoas capacitadas.

(quer saber mais sobre Zeami: CLIQUE AQUI)

   Os textos das peças Nô, em escrita arcaica são bastante estilizada e feita com pincel, são compostos de uma mistura de prosa e versos.
   As primeiras apresentações teatrais japonesas, como no Ocidente, eram realizadas ao ar livre, em pleno contato com a natureza. Mais tarde, as apresentações foram transferidas para recintos religiosos, depois para castelos.
   O palco do Nô é um verdadeiro poema arquitetural: conciso, simples e austero.


   A cortina no fim da longa passarela, separando-a da sala do espelho (vestiário), e os acessórios de palco. Palco e passarelas elevados do solo, sugerindo um altar. Existe a parede de fundo chamada “tábua de espelho”, que apresenta a pintura estilizada de um enorme pinheiro, todo retorcido, representando o pinheiro sagrado Yogo, uma árvore sagrada que os deuses desciam à terra. Passarela e palco fazem ser uma apresentação tridimensional como no teatro grego (anfiteatro).



  Os gestos e movimentos dos atores são bastante estilizados, o vestuário do Nô é exuberante, mas não extravagante. As linhas e ângulos retos do vestuário do Nô produzem uma silhueta rígida, adequada para a representação de visões e fantasmas que existem em profusão nas peças do Nô. Esse tipo de vestuário sofreu influências dos antigos trajes usados na corte pelos samurais. Todo o espetáculo é ritualístico, por isso até mesmo um simples pescador veste roupas solenes e fala grande poesia.
   O uso da máscara no Nô é um parceiro de forças ocultas da magia junto ao ator feitas de cipreste japonês, são ligeiramente menores que o rosto humano, fazendo aparecer o queixo do ator. As aberturas estreitas da máscara obstruem a visão do mundo exterior, forçando o ator a voltar seus olhos para o mundo interior. As máscaras dos cegos, representadas sempre com olhos cerrados. As máscaras se classificam conforme o seu uso e sua função. 


Veja no link abaixo a confecção da máscara Nô:

   A máscara "koomote" era protótipo de beleza feminina japonesa e arquétipo de máscara feminina jovem. A máscara masculina "chujo", apresente um requinte sutil, duas faces distintas: a luminosa e a sombria. Mesmo em reproduções bidimensionais, podemos verificar que, conforme as mudanças de posição, as máscaras apresentam nuances sutis de expressão. Cada uma possui seu próprio nível de distinção e qualidade, quanto mais bela mais difícil de ser representada e elas que determinam a escolha do vestuário, dos acessórios e da interpretação do papel.

(Koomote)

 (Chujo)

(Chujo)

 O processo de vestir-se para uma apresentação de Nô corresponde o início da desindividualização do ator. Após vestir-se o ator saúda a sua imagem no grande espelho em seguida saúda a máscara, um ato de possessão, onde o ator perde completamente a sua individualidade e sente-se transformado na personagem que irá interpretar.
   O lugar onde ficam os músicos, repercute os sons dos cantos, das músicas e das batidas dos pés dos atores. O coro possui cerca de 10 pessoas, não tem voz própria, cantando apenas os sentimentos das personagens. O Teatro Nô possui a música vocal (yôkyoku) e orquestra (hayashi). O canto falado no Nô deriva de músicas executadas durante cerimônias budistas.

(vocal - yôkyoku)

(orquestra - hayashi)

   A dança Nô é denominada shimai, pode apresentar-se separadamente com ou sem máscara, com acompanhamento de um coro menor. Durante as danças os deuses descem à terra, através do pinheiro Yogo, pintado na parede de espelho e encarnam nos atores dando assim um clima todo sobrenatural ao espetáculo.

(Shimai)

(uma apresentação de Nô)


  Alguns gestos são totalmente solenes, incompreensível aos leigos como é o caso do choro na qual o ator apenas inclina ligeiramente a cabeça. Podemos então considera o Nô um ideograma teatral.


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